Raquel Cozer
No Brasil, ações para levar autores a outros países são isoladas, não raro promovidas por diplomatas que se interessam pela literatura nacional. Em outros tempos, chegou a receber alfinetadas da imprensa a iniciativa do tradutor Eric Nepomuceno, então secretário de Intercâmbio e Projetos Especiais do MinC, de promover viagens com escritores - falava-se em "trem da alegria". No ministério, Nepomuceno criou ainda, com apoio do Itamaraty, um programa de escritor-residente em universidades dos EUA. A secretaria foi fechada em 1998, e o programa, encerrado. "Não adiantam atitudes pontuais. É preciso fazera apostas a longo prazo. Outros paises têm política de continuidade, artilharia pesada. Nós temos foguetinhos espalhados ao léu", diz Nepomuceno, crítico do fomento da FBN. "Cada edital não chega a R$ 100 mil. Comparando com Alemanha, França, Espanha, é constrangedor."
Patricia Melo diz se sentir privilegiada por ter romances traduzidos em "toda a Europa e nos EUA". Viajar para divulgar lançamentos, afirma, faz diferença. "A recepção é diferente. Você participa de um debate que chama atenção para o seu livro e para o que se produz no Brasil." Boa parte do mérito ela credita aos agentes literários. "Minha primeira agente dizia que para trabalhar com autores brasileiros era preciso paixão, para compensar a frustração da empreitada." De fato, editoras e agentes são os maiores divulgadores de autores no exterior, o que coloca a venda de direitos autorais mais como negócio que como estratégia cultural. É com ênfase ao lado comercial que trabalha o projeto Brazilian Publishers, uma parceria da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações, subsidiada pelo governo) com a CBL (Câmara Brasileria do Livro). A meta é capacitar editores para que cheguem às feiras internacionais com perspectiva de vender direitos de seus autores, e não apenas comprar. Para tradutores, o benefício de difundir a literatura vai além da economia. "Há utilidade em termos políticos e turísticos", avalia Berthold Zilly, professor de literatura latino-americana na Alemanha, "mas é acima de tudo importante para a compreensão e o enriquecimento cultural." Dantas, do MinC, enfatiza esse aspecto. "Ao exportar literatura, você explica ao mundo quem você é de maneira profunda, sai dos clichês."
A agente literária Lucia Riff chama de "trabalho de formiguinha" o que faz para divulgar seus agenciados, como Lya Luft e Luis Fernando Veríssimo. Casos como o da edição italiana de Mãos de Cavalo, que ganhou segunda tiragem, são raros. Até mesmo para Galera, que, agenciado por uma italiana e por sua editora no Brasil, calcula ter vendido algo entre 500 e mil cópias do livro em outros países. "Em geral, fica nos 3 mil", diz Riff sobre as obras de seus autores no exterior. "Se reimprime, a gente solta foguete."
O desconhecimento da língua portuguesa é outro entrave. Riff diz que precisa traduzir por conta trechos de livros para levar a feiras. Zilly, que já verteu na Alemanha Machado de Assis e Euclides da Cunha, lembra que estudiosos de língua portuguesa costumam falar espanhol, embora o inverso não ocorra. E levanta um ponto delicado, de certo modo relacionado: "Quais são os grandes nomes da literatura brasileira hoje? Da América hispânica, saíram Roberto Bolaño, Cesar Aira, Jorge Volpi. O Brasil tem o quê? Há Milton Hatoum, Bernardo Carvalho. Pode haver outros fantásticos, mas não chegam até nós."
O alemão destaca ainda prêmios para tradutores, que existem em vários países. No Brasil, ele recebeu só condecorações. "Acho bonito, gosto de ser honrado, mas dinheiro faz diferença." Capacitação de tradutores e intercâmbio de autores são propostas que, para o MinC, até soam bem, mas só no plano das idéias. Por enquanto, a prioridade é apenas aumentar o número de bolsas de tradução, de 20 para 100 anuais, e incluir editoras brasileiras na concorrência, de modo que possam oferecer títulos já traduzidos a estrangeiros. Definir prazos para isso é outro assunto.
O Estado de São Paulo, 8 de maio de 2010; o texto aqui publicado é um extrait.
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